Pantanal sofre com grande número de incêndios em 2020

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Perda de fauna e flora e impacto no clima, são algumas das consequências causadas pelo fogo

O segundo semestre não começa nada animador no Pantanal. Em julho foram 1.684 focos de incêndio no bioma, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), ante 494 no ano passado e 1.259 em 2005, ano em que havia tido mais fogo neste mesmo período. Este foi mais um recorde nos 22 anos de monitoramento do instituto, o terceiro em 2020, juntamente com março e abril, que tiveram 602 e 784 focos respectivamente. Até o dia 12 de agosto já ocorreram 2.411 queimadas. No ano, o acumulado está em 6.629.

E a situação daqui para a frente tende a piorar, já que este ano o Pantanal está com estiagem atípica, com o rio Paraguai 1 metro abaixo do normal para este período do ano e agora, com o período de seca, baixa umidade, aumento de vento e posteriormente de temperatura.

Corumbá (MS) continua sendo o município com maior número de queimadas do bioma e do país, até o 12 de agosto foram 3.918 durante todo ano. Poconé (MT), que também está situada no Pantanal, é a quarto município do país em ocorrências, com 1.481. Outro dado alarmante é a área queimada no bioma. De janeiro a julho foram consumidos 846.700 hectares pelo fogo, o que representa 5,6% de todo o Pantanal.

“Precisamos criar formas que incêndios dessa magnitude não ocorram mais, vai ser uma grande perda de natureza, qualidade do solo e da água, cinzas que vão para os cursos da água, contaminando sua qualidade e a disponibilidade de peixes, prejudicam a qualidade do ar. Nossa qualidade de vida vai se queimando junto com o Pantanal, pois uma das funções do nosso bioma é disponibilizar água limpa e ar puro”, alerta Rafaela Nicola, diretora executiva da Wetlands International Brasil.

Impactos naturais

As consequências causadas por este grande número de focos de incêndio são diversas, entre elas: perdas de biodiversidade, fauna e flora sofrem em decorrência das queimadas; perdas da qualidade do solo, gradualmente a terra fica mais frágil e menos fértil; além do impacto nas mudanças climáticas.

“Os impactos reais são difíceis, talvez até impossíveis de serem estimados, dada a extensão e intensidade dos incêndios e, também, pela falta de conhecimento acerca das espécies e falta de levantamentos do que foi perdido”, afirma o pesquisador de Manejo e Conservação de Vida Selvagem da Embrapa Pantanal, Walfrido Tomás.

Em relação à fauna, ele indica que diversos animais perecem aos incêndios. “Não é difícil imaginar a quantidade de espécies incapazes de escapar do fogo, como abelhas nativas, aranhas, formigas, borboletas, répteis de pequeno porte, anfíbios, aves que nidificam nesse período, pequenos mamíferos, morcegos, etc. Esses animais podem até ser extintos localmente ou suas populações deixadas à beira da extinção local em áreas afetadas pelo fogo, dependendo de sua intensidade”, alerta.

Outro fator que prejudica a vida selvagem é a intensidade dos incêndios. “Onde atingir com maior intensidade, certamente o impacto será muito grande e é de se esperar que leve um longo tempo para que a recolonização dessas áreas ocorra e tudo volte ao que era antes. É improvável que isso ocorra rapidamente, apesar da vegetação poder se mostrar viçosa rapidamente após o período de chuvas”, ressalta o pesquisador.

A fauna também é bastante prejudicada dependendo do tipo de incêndio – superfície, subterrâneo ou de copa –, do tipo de vegetação – cerrado ou florestal – e da frequência com que o fogo ocorre na mesma localidade.

“No Pantanal, ocorrem áreas com vegetação de cerrado que são adaptadas ao fogo. Porém, estudos mostram que incêndios frequentes na mesma localidade tendem a alterar a fisionomia da vegetação, passando de formações lenhosas e densas para outras mais campestres e abertas. Porém, as Matas Semidecíduas, Ciliares, de Galeria, e as áreas inundáveis que ocorrem no Pantanal possuem composição de espécies não tolerantes às queimadas. Nas áreas úmidas as espécies sensíveis serão afetadas (pouco resilientes ao uso do fogo) e aparecerão as espécies menos sensíveis como espinheiros. A recuperação também vai depender da época do ano (condições climáticas) e manejo pós-queima”, explica Sandra Santos, pesquisadora de Manejo Sustentável das Pastagens Nativas da Embrapa Pantanal.

Os incêndios ainda contribuem para as mudanças climáticas. “Segundo dados da literatura, dependendo do tamanho da área queimada, são emitidas toneladas de dióxido de carbono para a atmosfera, contribuindo para o aumento do efeito estufa e, consequentemente, para o aquecimento global. No Brasil, as queimadas são responsáveis por praticamente 50% das emissões de gases de efeito estufa”, destaca Balbina Soriano, pesquisadora de Climatologia/Agrometeorologia da Embrapa Pantanal.

Apesar de não se saber ainda com exatidão o quanto vai ocorrer de perda de biodiversidades, já se pode dizer que a situação é catastrófica. “Quando olhamos para a extensão de hectares incendiados, tem que se imaginar que o que está se perdendo são áreas com uma gama gigantesca de riquezas de espécies, tanto de fauna quanto de flora. Só de saber a quantidade de hectares que se perdem no Pantanal, uma quantidade que nunca se viu, é uma catástrofe. Têm espécies que têm pouca mobilidade e não conseguem se mover para fugir, pois não tem para onde migrar, já que as áreas do entorno também foram afetadas. Mesmo espécies que conseguiriam escapar, nessa situação de fogo disperso não conseguem”, lamenta Rafaela.

Primeiro semestre alarmante

O primeiro semestre de 2020 foi extremamente alarmante e, caso a tendência vire realidade, os meses que estão por vir devem ser piores para o Pantanal. Foram registrados pelo INPE 2.534 focos de incêndio na região, um recorde histórico para o período desde que o instituto começou o monitoramento, em 1999. O segundo ano com mais incêndios entre janeiro e junho foi 2009, com 2.216 focos, e o terceiro foi 2005, com 1.156. (Confira no gráfico abaixo os números de todos os anos).

Para se ter uma ideia, se compararmos esse mesmo período com 2018, há dois anos, quando ocorreram 138 focos, o número deste ano é 1.736% maior. Já com o ano passado foram registrados 981 focos, número 158% menor que o deste ano.

As queimadas não controladas comprometem não só a fauna e flora nativas, como também são geradoras de implicações econômicas diretas. Quando a queima ocorre sem critérios, sobretudo em época inadequada, pode trazer consequências diversas em diferentes escalas, que vão desde o risco para as populações rurais à degradação ambiental.

Pelo fato de estarmos passando por uma pandemia mundial causada pelo novo Coronavírus (SARS-CoV-2), quando as pessoas que não prestam serviços essenciais deveriam estar em isolamento social recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o fogo deveria diminuir este ano, mas não é o que vemos na prática.

Diversas razões fazem aumentar os incêndios, como o corte do orçamento do IBAMA e do INPE, capacidade reduzida do Corpo de Bombeiros que provocam reações tardias, falta de ação por parte do governo em mobilizar força do Estado para controlar o fogo, falta de capacitação humana de práticas de manejo com fogo adequadas para a região, além de inúmeras ações governamentais que visam ao lucro acima da conservação ambiental.

A Wetlands International Brasil monitora esta situação e publica periodicamente nas redes sociais (Facebook, Twitter e Instagram) e no site, informações sobre o fogo no Pantanal e seus impactos. Acompanhamos este cenário com preocupação e esperamos uma rápida e efetiva resposta de nossos governantes para conter a ocorrência.

Fogo no Pantanal, Poconé (MT) / Foto: Jeferson Prado – Sesc Pantanal